terça-feira, 8 de outubro de 2013

Playlist da Depressão


Durante as férias, remexendo alguns livros antigos acabei por encontrar o livro “A vida segundo Peanuts”, no qual Charlie Brown e seus amigos, nas famosas tirinhas de Charles Schultz, dão pequenos ensinamentos sobre a vida. Uma em especial me chamou atenção, esta que ilustra o post, que a vida tem momentos bons e ruins, picos e vales, dias e noites... É assim que as coisas são. E esta playlist é para os momentos de vale... As músicas mais tristes que eu conheço, e talvez algumas das mais bonitas. É possível ver o sentimento, a melancolia, a agonia e a desolação em cada uma delas, e enxegar a beleza nisto, afinal, elas também fazem parte da vida. Picos e vales...

Sufjan Stevens - Casimir Pulaski Day: A história de um amor interrompido por um câncer é um assunto altamente improvável para ser objeto de uma canção, mas Sufjan Stevens e seu banjo conseguem trazer beleza e leveza à desolação e a sensação de impotência que uma doença desta traz. Bela e contundente. 
“... All the glory that the Lord has made and the complications when I see His face in the morning in the window...”

Patrick Watson – The Great Escape: Quem nunca teve um dia ruim? Onde tudo que se quer é desaparecer, longe do barulhos, dos risos forçados, buscar o caminho de casa... Relaxar e esperar as coisas acalmarem são as palavras de ordem da canção e sua melodia realmente fazem isso com a gente.
“...Hey child, things are looking down, that's okay, you don't need to win anyways...”

Marissa Nadler – Under an Old Umbrella: Um encontro com um desconhecido de olhos turquesa debaixo de um guarda-chuva velho fazem uma moça de olhos de cor de amargura aquecer seu corpo frio. Sua voz etérea transmite uma tristeza antiga e profunda que falam mais alto que este encontro amoroso.
“Say hello to the sea or to the lonely water, say hello to the sea under the skies of azure...” 

Paul Tiernan – How to Say Goodbye: Fins de relacionamentos são tristes. E fim de relacionamentos em série? Uma pessoa que ama dizer adeus e sua incapacidade de ligar-se aos outros sintetizam nesta música simples a toda a melancolia de um relacionamento que não foi para frente.
“...Run away and try to forget just not to stay, to leave without saying why...”

The National – Sorrow: E se a tristeza te encontrasse quando você ainda era jovem? E se ela vencesse você? E se você morasse em uma cidade que a tristeza construiu? Essa música transmite muita coisa para mim, é uma das minhas preferidas do The National. E uma das mais bonitas.
“Sorrow found me when I was young, sorrow waited, sorrow won...”

Lana Del Rey – Yayo: Uma garota perdida em um trailer park disposta a sair daquele ambiente decadente e amargurado. Shows privados, casamentos furtivos em Nevada, vestidos de casamentos baratos fazem parte do cenário construído por Del Rey (e segundo algumas teorias, baseado em fatos reais de sua vida) e lindamente entoados nesta canção de ninar um pouco macabra.
“Hello Heaven, you are a tunnel lined with yellow lights on a dark night...”

Travis – Why Does It Always Rain On Me?: Essa música já foi um hino para mim, quando eu costumava achar que as coisas não davam certo somente para mim. A indignação e a impotência são belamente exprimidas por meio da poesia de Fran Healy sobre àqueles momentos onde todos estão bem, exceto você.
“I can’t sleep tonight, everybody's saying everything is alright, still I can't close my eyes... I’m seeing a tunnel at the end of all these lights...”

Essa playlist não tem por intenção promover ou endossar a tristeza, a melancolia ou a depressão (embora este possa ser um efeito colateral dela, rs), mas sim mostrar que estes momentos existem e podem ser superados. Fazem parte da vida. Picos e Vales. :)

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Literatura: As Virgens Suicidas


Aproveitando o tempo livre das férias eu peguei um dos meus livros favoritos para reler, “As Virgens Suicidas”, de Jeffrey Eugenides, publicado inicialmente em 1993, e recentemente relançado em uma nova tradução pela Companhia das Letras. E novamente fui arrebatado por uma explosão pungente de sentimentos e reflexões que somente uma obra de tamanho talento e importância é capaz de despertar. Relatando a tragédia que se abate sobre a família Lisbon e suas 5 filhas, em um subúrbio americano nos anos 70, Eugenides, em seu romance de estréia, tece um sensível panorama do crescimento e das dores da adolescência em uma primeira leitura. Mas como toda grande obra é rica de múltiplos significados e leituras, aprofunda-se sobre as relações superficiais do mundo atual, a aversão aos inadequados, os efeitos nocivos de uma educação repressiva e controladora e a melancolia sobre um tempo que não volta, borrado e modificado pela memória. É difícil não dar detalhes da estória, visto que até o título entrega o desfecho final do livro, mas o importante da prosa de Eugenides é como ele se aproveita de um relato quase confessional de um grupo de garotos, vizinhos das meninas Lisbon, para dar vazão à sentimentos como a paixão, o amor, a admiração, o temor e a confusão típicos da adolescência (e por que não da vida adulta?). O texto é fluído e apesar do tema difícil e pesado, usa de um lirismo quase fantasioso que empresta um ar de extraordinário e mágico aos acontecimentos ordinários do passado, artifício comum quando imaginamos (ou lembramos) de fatos ou pessoas que nos falam mais perto ao coração. E isso acontece também ao leitor de “As Virgens Suicidas”, é uma tarefa árdua não se emocionar ao ler suas páginas e desejar de alguma forma interferir naquela tragédia anunciada, mudar o destino cruel daquelas garotas como os protagonistas-invisíveis também desejaram. Traduzido em mais de 34 idiomas, “As Virgens Suicidas” tornou-se um clássico da literatura americana atual e foi levado às telas de cinema com o mesmo cuidado e delicadeza pelas mãos de Sofia Coppola, forma pela qual eu conheci o livro, e igualmente recomendado àqueles que se encantarão pelo livro. Descendente de gregos, Jeffrey Eugenides criou uma tragédia grega contemporânea, onde Destino, Morte e Paixão, determinam a vida dos mortais, como na Antiguidade, em uma história cheia de tristeza, suicídio e melancolia, mas ainda assim repleta de beleza. 

domingo, 15 de setembro de 2013

Janelle Monáe - The Electric Lady


É verdade que a história se repete em ciclos: alguma coisa é considerada de vanguarda, torna-se moda, a moda torna-se o padrão, o padrão torna-se obsoleto até que surja outra coisa considerada de vanguarda para dar continuidade ao ciclo. Muitas vezes o que é considerado de vanguarda na verdade já é algo conhecido, tornado obsoleto e esquecido que retorna com uma nova roupagem, uma nova cara. O mundo da música também funciona assim. Uma vez ou outra um artista novo rompe esse paradigma e acrescenta algo de realmente diferente, e consegue entrar para história. Aconteceu assim com Louis Armstrong, David Bowie, Tom Jobim, Michael Jackson, Madonna e a julgar pelo último lançamento de Janelle Monáe, The Electric Lady, é entre esse panteão que ela deseja figurar. 

“The Electric Lady” é a terceira e derradeira parte de um projeto ambicioso iniciado em 2007, quando foi lançado o seu primeiro EP “Metropolis: Suite I (The Chase)”. Através de sua música, Monáe desejava contar a história de Cindi Mayweather, uma androide de um futuro próximo que ao apaixonar-se por um humano, Anthony Greendown, e recusar-se a ser desmontada (destino dado aos androides transgressores) inicia uma revolução. No seu segundo álbum, “The ArchAndroid”, Cindi continua sua fuga e ganha ares de mártir e messias de uma nova ordem mundial. Na récem lançada “The Electric Lady”, Cindi Mayweather ganha consciência da sua força e do seu poder. Já não bastasse a singularidade da história que segundo a própria cantora pode ser transposta para a comunidade negra, ou a comunidade homossexual ou às mulheres, em suas respectivas lutas para a garantia de respeito e direitos civis e individuais, deve-se também levar em consideração a coragem de lançar álbuns conceituais em uma indústria cada vez mais sedenta por singles rentáveis. 

Janelle Monáe faz tudo isso produzindo música de excelente qualidade. Em seu último álbum, contando com a ajuda de grandes nomes da música atual (todos expoentes da black music, como Prince, Erykah Badu, Solange Knowles, Miguel e Esperanza Spalding), ela desfila com elegância todo o seu groove, flertando com o rock, o pop, o hip hop, o rap e até mesmo a ópera em seus overtures. É difícil decidir quais são faixas destacam-se mais devido à qualidade do álbum como um todo, mas são grandes candidatas à clássicos da black music contemporânea: a power-ballad “Primetime”, no qual divide os vocais com o astro do hip-hop Miguel, a uptempo “We Were Rock ‘n’ Roll”, a semi gospel “Victory”, o soul de “Dorothy Dandridge Eyes”, além dos singles já lançados “Q.U.E.E.N.” e “Dance Apocalyptic”.

Monáe encontrou em “The Electric Lady” a fórmula perfeita para equilibrar sua voz única e aveludada, com melodias cheias de swing e mensagem social. Sua sonoridade levemente retrô sessentista, ecoa o rhythm and blues, o soul e o funk dos discos da era de ouro da Motown, mas aponta mesmo é para o futuro da música contemporânea.

sábado, 24 de agosto de 2013

Growing Pains

Não é fácil abstrair, mas você já pensou que talvez você não seja a perfeição de pessoa que você imagina ser? Que talvez aquele seu colega de trabalho te ache um escroto por algo que você nem fez? Ou até fez, mas não percebeu? Que aquela vizinha que você não gosta, por razões desconhecidas até por você mesmo, tem o mesmo direito de não ir com a sua cara que você? Você não acha que falam de você com a mesma maledicência (mas não maldade) que você fala dos outros, ao telefone com amigos próximos? Você não acha mesmo que destruiu o coração (ou até mesmo a vida) daquela menina que você enganou? Talvez não tenha sido a sua intenção, mas aquele choro foi real... Você é, sim, capaz de machucar alguém. É difícil pensar dessa maneira porque estamos acostumados a pensar que estamos sempre certos e enxergamos o mundo pela nossa perspectiva e sob nossos valores. Mas a dura realidade é que como seres humanos somos imperfeitos, tendemos ao erro e escondemos nossos sentimentos. Somos, enfim, humanos. 
A raiz para esta distorção da realidade talvez esteja na infância, com pais eternamente satisfazendo as necessidades mais pueris das crianças, tornando-os adultos egoístas e mimados. Talvez. Talvez seja a adolescência e a necessidade da criação de uma imagem auto-afirmativa: uma proteção para os medos e as incertezas do crescimento – as coisas TÊM que ser da nossa maneira. Talvez não. Talvez seja intrínseco do ser humano fazer as coisas e levar a vida guiado pelo seu próprio umbigo. Não gostamos de receber ordens. Não gostamos de confrontos. Não gostamos, porque não é do meu jeito – e ponto! O problema é que ao atingir a vida adulta iremos confrontar e sermos confrontados com a perspectiva de mundo do outro – também auto-suficiente, auto-afirmativo e, invariavelmente, contra você... – nas relações interpessoais, nas relações de trabalho, nas relações corporativas, na mesa de bar. O inferno são os outros. É difícil reconhecer os nossos próprios erros e as nossas falhas, mas é fundamental, para o nosso crescimento e amadurecimento. O mundo não gira à nossa vontade. Nunca. Não existe um Big Brother pessoal acontecendo atrás do espelho do seu banheiro, onde a única pessoa que você não consegue mentir no mundo irá lhe encarar: você mesmo. 
O que você diria desse íntimo desconhecido? O que essas olheiras que estão se acumulando abaixo dos seus olhos têm para contar? E o que esses sinais e linhas de expressão dizem à você mesmo? Você quer apaga-los com cremes rejuvenescedores e Botox? E essa lágrima que cai agora será superada por algum riso do futuro? Ou até mesmo do passado? O que você pensaria de você visto de fora? Este é um bom exercício para se fazer de vez em quando e segue a mesma linha de pensamento quase bíblico que prega: “não faça com os outros o que você não gostaria que fizessem com você”. Pensar dessa maneira é como levar um soco no estômago ao ser questionado:

- Você passaria pelo seu próprio julgamento?

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

O Despertar

Ontem despertei de um sono profundo. Na verdade, eu nem estava dormindo, eram 19:36 e eu estava na rua, em pé, olhando o trânsito e a confusão da cidade, mas eu despertei. Sonhos intranquilos. Eu havia corrido, eu estava sempre correndo, e aquela infinitude de carros parados, uns atrás dos outros, enfileirados à espera de uma resolução para o engarrafamento (ou seriam dos seus problemas?), me fez pensar um pouco. E neste pensar, eu despertei. Caía uma garoa fina, que não ia durar muito, apenas o suficiente para atrapalhar os planos de quem queria chegar mais cedo em casa - a Natureza tem dessas coisas- e os pequenos pedaços de grama remanescentes entre o cimento, o calçamento e o asfaltos, soltavam o cheiro doce de terra quando é molhada, logo abafado pela fumaça dos carburadores de uma infinitude de carros enfileirados. Havia barulho: conversas alheias sobre amenidades, brigas de casais, buzinas e risadas e esperneios daqueles que esperavam dentro e fora dos automóveis pela resolução do tráfego, logo sendo silenciados pelas gotas de chuva que começavam à engrossar – a Natureza tem dessas coisas. Eu estava ali, em pé, alheio à tudo aquilo, sentindo a chuva e, estranhamente confortável naquela posição. Talvez tenha sido a luz vermelha, agora embaçada pela chuva, dos faróis traseiros dos carros constantemente com o pedal do freio pressionado, talvez tenha sido a música que ouvia no momento, a batida forte e eletrônica de Moon Theory, talvez tenha sido a sensação de frescor dos pingos da chuva, batendo no meu rosto, após uma corrida (ou talvez, uma vida toda corrida?), ou talvez tudo isso junto me fez despertar de um sono profundo. Senti como há muito não sentia que estar vivo é uma dádiva, percebi que todo sofrimento não dura e é, muitas vezes, sem razão, que, ainda que não desejemos, ainda vivemos em coletividade e ação do outro – ou a sua ação – ainda reflete na vida dos demais, e que quando a chuva cai, ela cai para todos. Pode parecer um imenso amontoado de lugar-comum, cliché, ideias vagas, mas foi a percepção disto que me fez despertar. Foi um adormecer anestesiado, um sub-limiar de percepção, daquele que não revigora e que a gente se questiona a todo momento se é real ou não. Sonhos intranquilos, é verdade.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

As Dores de Ser Bonzinho

Bonzinho é um cãozinho. Tem 5 anos, é um vira-lata bonitinho e sabe-se lá por quê seus donos quiseram lhe batizar desta maneira, mas por Bonzinho lhe chamaram, por insistência, Bonzinho atendia. Bonzinho foi o quinto de uma ninhada de sete, ele não conheceu muito dos seus irmãos, fora o Mais Velho e duas cadelinhas, no sentido ruim da palavra. O Mais Velho, seguido e admirado de perto por Bonzinho, é um vira-lata amarronzado, malandro, dono do próprio focinho, um cão das ruas. As duas cadelas não sabem fazer nada além de bocejarem com a barriga para o alto, pondo as patas para o ar, esperando um cafuné, são cadelas de madame, Bonzinho não tem muita afeição a elas. Bonzinho não se lembra da sua mãe, mas lembra-se do sentimento de ter sua cabeça lambida enquanto mamava, e como era quentinho, no meio dos seus irmãos, ficar naquela posição, protegido do mundo. Quando se lembra disto, Bonzinho fecha os olhos e acha que está contente. Bonzinho queria ser como seu irmão, sem amarras, sem coleiras, sem lei. Mas Bonzinho sempre foi bonzinho, até um pouco demais. Sempre fizeram acreditar que Bonzinho não era mais um vira-lata: “Bonzinho, seu focinho é o mais bonitinho de todos os outros cachorrinhos!”. “Bonzinho, como você é esperto!”. “Bonzinho, eu te amo!!!”. Bonzinho não entendia muito daquilo, sentia-se como qualquer outro cachorrinho e frente à tanto amor e carinho, somente rolava, de um lado para o outro, com a língua pra fora, gozando de toda aquela situação.


Bonzinho se fascinava era mesmo pelo cheiro vivo que vinha das calçadas, vivia pelas escapadas que dava sempre que alguém esquecia o portão da casa aberto ou quando chegava alguma visita. Ele não perdia uma oportunidade, sempre que podia, lá estava Bonzinho explodindo pela rua, em meio ao desconhecido, com todo aquele barulho e confusão que ele só vislumbrava pelos buracos do muro do quintal ou fantasiava com as histórias contadas pelo Mais Velho. As cadelas olhavam de lado, com desdém: “Ora, Bonzinho, você não foi feito para as ruas...”; “Deixa ele, vai acabar atropelado!”. Mas Bonzinho fingia não ouvir suas irmãs, caminhava com a cabeça baixa, ressabiado, em direção ao quintal, para logo, distrair-se perseguindo uma borboleta, a esmo. Como aquilo era bom! Aquilo já lhe satisfazia, o correr exasperado em direção aquele estranho ser voador e amarelo, ora aqui, ora ali, isso Bonzinho amava. Não iria se preocupar com o que falavam as cadelas se ele se divertia sozinho, perseguindo uma borboleta e como aquilo era bom. 

Quando chegava à noite, solto no quintal, Bonzinho fazia a festa, corria de um lado pra outro, olhava as estrelas e queria latir para elas, algumas vezes chegou a latir e aquilo era maravilhoso, melhor que perseguir borboletas, melhor que correr nas suas escapadas. O pessoal da casa estranhava: “O que será que deu em Bonzinho?!” Bonzinho continuava a correr de um lado para o outro, na esperança de alguém pular o muro e ele poder avançar, como assim lhe falaram para fazer um dia e ele, de alguma forma, sabia que era aquilo que devia ser feito. Ele não sabia como e nem o porquê, mas se alguém entrasse ele iria avançar. Não teria medo. De certo, não teria medo mesmo. E isso satisfazia Bonzinho, saber que não era apenas bonzinho, era corajoso. Corajoso e sabia latir pra lua e para as estrelas, pode um cachorro ser mais feliz que isso? Bonzinho se recusava a acreditar que existia felicidade maior que aquela. 


Isso foi até o dia que deixaram o portão aberto à noite, e como era natural à Bonzinho, ele explodiu portão à fora, chamado pelo cheiro das calçadas. E essa noite foi a mais feliz de sua vida. Bonzinho chafurdou o lixo, acabou comendo algumas coisas estragadas, e não importava, adorou a sensação. Bonzinho descobriu que a calçada da sua casa desembocava em outra calçada, e esta em uma outra, e esta outra em outra diferente, numa profusão sem número de calçadas que o deixou confuso. Confuso, mas feliz. Longe da sua casa, Bonzinho caminhou entre muitas pernas de pessoas que não eram as da sua casa, nem aquelas que vinham aos finais de semanas trazendo comidas em travessas. Bonzinho não tinha medo daquelas pernas. Latiu para dois outros cachorros, ambos menores, estava a fim de brigar, mas seus adversários estavam encoleirados. Pensou que talvez fosse melhor assim. E por toda a noite Bonzinho vagou... No caminho para casa, parou para olhar o céu e naquele dia ele estava ainda mais iluminado e brilhante. Bonzinho latiu para o alto como nunca tinha latido antes. Estava realizado. Voltou para o conforto do seu quintal e foi dormir após a maior escapada que tinha dado na sua vida de cão. Não era mais apenas o cãozinho Bonzinho. Era outra coisa. Dormiu esboçando um sorriso, com a língua pra fora, exausto. Jamais poderia supor que existia um pouco de lobo dentro de cada cão Bonzinho.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Playlist Fevereiro


Enfim, finalmente o ano de 2013 começa após o Carnaval, que foi a desculpa usada por muitos (sei...) para se enfiar no axé, no arrocha e no sertanejo universitário... Então, a playlist de início de ano vem com uma seleção que conta com o folk de Damien Jurado com a a faixa "Working Titles" do seu último álbum, 'Maroqopa', o alternative pop de Marina & The Diamonds com "Buy the Stars", faixa bônus do ótimo "Electra Heart", o inclassificável som hippie-cigano de Edward Sharpe & The Magnetic Zeros em "Man on Fire", o indie rock do "The Shins" com "It's Only Life" e, finalmente, completando com o rock clássico do "The Temper Trap" em "This Isn't Happiness". Feliz 2013!



Arte extraída de http://thisisnthappiness.com

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Grandes Álbuns Negligenciados da História da Música Brasileira: Mariana Aydar – Peixes Pássaros Pessoas


O samba, assim como a bossa nova, é um gênero genuinamente brasileiro, mas, apesar dos gênios deste ritmo como Cartola, sempre foi considerado um gênero menor (talvez pela sua proximidade com o pagode ou por mero elitismo da crítica). Por isso, parece natural homenagear este ritmo tentando explicar por que o segundo disco da cantora paulista Mariana Aydar, ‘Peixes Pássaros Pessoas’, merece destaque junto aos grandes nomes do gênero e da música brasileira. Primeiramente, Mariana Aydar, expoente da nova geração da MPB, não pode (nem quer) ser considerada uma sambista, sua formação multi-instrumental e intuitiva a tornam muito mais uma cantora experimentadora do quê de um gênero só. Suas primeiras gravações transitaram pelo forró, baião, bossa e jazz, mas aqui ela empresta sua voz cristalina para o samba e se saí muito bem neste intento, embora na faixa “O samba me persegue”, com participação de Zeca Pagodinho, ela demonstre que sua relação com o gênero é muito mais forte e extrapola esse álbum. Assim como Mariana, o disco também transita pelos gêneros como percebemos pelos metais típicos do jazz em “Palavras Não Falam”, a marcação grave do bumbo no baião desencontrado de “Tá?”, as guitarras distorcidas do rock “Peixes”, e as cordas em crescendo típico dos sambas-enredo em “Poderoso Rei”, todas mantendo uma unidade na interpretação precisa da cantora, criando um som atual e de bom gosto. As composições, três delas assinadas pela própria Mariana com o pseudônimo de Kavita, segundo a própria intérprete, procuram refletir o sentimento da nossa época: solidão, inadequação, insatisfação... Em “Beleza”, um dos pontos altos do disco, em um dueto com a cantora cabo-verdiana Mayra Andrade canta sobre a maravilha do ato de cantar (ou seria do ato sexual? Ou as duas coisas se misturam?). A faixa “Palavras Não Falam” é uma inspirada reflexão sobre a escrita, a composição e a imperiosa necessidade de transpor para palavras toda a vida e ideação interior, que quem escreve irá se identificar. Já “Peixes”, inicialmente da dupla zen-budista “The Dharma Lóvers”, é um retrato sobre a sociedade atual e sua insatisfação: “Peixes, pássaros, pessoas nos aquários, nas gaiolas, pelas salas e sacadas. Afogados no destino, de morrer como decoração das casas. Nós vivemos como peixes com a voz que nós calamos, com essa paz que não achamos...”. Nada parecido com os típicos amores perfeitos, dores de cotovelo e o romantismo fácil das composições do samba, aliás, a única música verdadeiramente com temática romântica, “Teu Amor É Falso”, fala justamente sobre o fim do romance, justo, sem firulas. O encarte finalizando o conceito do disco mostra a cantora nos escombros do galpão da escola de samba paulista Leandro de Itaquera, quase pós-apocalíptico. Seja no experimentalismo da temática ou no tradicionalismo do samba de raiz, o disco “Peixes Pássaros Pessoas” mostra uma cantora segura, uma produção bem feita e que o samba não pode ser considerado um ritmo menor na música brasileira: é MPB da melhor qualidade. 

Pra entender, ouça: “Florindo”, “Peixes”, “Beleza”, “Nada Disso é Pra Você” e “Manhã Azul”.


"Eu me entendo escrevendo/E vejo tudo sem vaidade/ Só tem eu e esse branco/ Ele me mostra o que eu não sei/ E me faz ver o que não tem palavras..."


"Deixa estar que a vida é mais sábia..."

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Vivo

Você já sentiu a brisa fria por todo o corpo ao final da tarde? Aquela sensação mágica que passa por toda a sua pele, eriçando todos os seus de fios de cabelos e pelos ? Você já se perguntou por quantas pessoas aquela mesma brisa já passou, eriçando seus fios de cabelos e pelos? Já se perguntou quantos fazem parte desta cadeia invisível? Você já hesitou antes de mergulhar de cabeça numa onda fria do mar nos meses de junho a setembro? Já pulou duas marolas na esperança infantil de ganhar coragem ou de que a próxima onda venha com a água um pouco menos fria? Você já se arrependeu, ao mergulhar no mar, nos meses de junho a setembro, que não deveria ter hesitado tanto, pois água do mar nesta época do ano, banhando seu corpo inteiro está exatamente na temperatura ideal, nem quente, nem fria, apenas, ideal? Você já saiu do mar após o mergulho ideal e fechou os olhos pra perceber melhor o sol de um inverno-quase-primavera enquanto ouve o oceano te chamando nas suas costas? Você já pôs os pés na areia molhada e sentiu seu peso afundar as suas pegadas num formato único? Já pensou quantas pessoas pisaram a areia molhada, com seus pesos afundando suas pegadas e nenhuma delas era você? Já ouviu os grilhos cantarem algo ininteligível e profundo, no início da noite, enquanto o céu se colore de um vermelho acobreado para depois ganhar o breu máximo e total? Já se perguntou por que os grilos o fazem? Já olhou para o céu estrelado e se maravilhou com o brilho das estrelas ao norte? Você sabia que boa parte das estrelas não está mais ali brilhando para nós? Você já caiu no sono olhando para o céu e se perguntando inúmeras coisas sem sentido como se existe vida lá fora ou se amanhã irá chover? Você já ouviu algo tão bonito como uma canção americana que você pouco sabia a letra, mas de alguma forma aquilo te tocou e te comoveu? Você já sentiu esse arrepio coincidente com os picos de um grito agudo de alguma cantoria barata? Você já ouviu o som de um violino? Já conseguiu distingui-lo dos demais sons de uma orquestra? Você também achou que ele estava chorando, um choro guardado, repleto de mágoa, e vai ver por isso, era tão libertador? Você já sentiu um nó na garganta quando viu alguém deitado no chão da calçada? Já imaginou a vida daquela pessoa invisível? Já pensou que a brisa fria no final da tarde podia ter passado por ele? Já sentiu seu peito apertar quando uma criança está caindo? Já quis correr para socorrê-la, mesmo que ela não tenha tido nada? Já pensou que quando você foi criança você também caía? Já pensou quem iria lhe socorrer, mesmo que você não tenha tido nada? Você já se perguntou? Já teve tantas perguntas na cabeça que as sente como uma quase enxaqueca, nunca chegando a se concretizar? Já quis tirar o peso destas interrogações do fundo da sua cabeça? Já achou que estas perguntas estavam pesando-lhe o pescoço e torcendo a sua coluna? Já pensou que talvez esse seu movimento com o pescoço para os lados, que às vezes resulta num estalinho, não sirva para nada? Já pensou quantos já fizeram esta mesma pergunta? Já se perguntou quantos fazem parte desta cadeia invisível? 

Então, eu já, e é isso que me mantém vivo.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

O homem que desapareceu

Não saberia dizer ao certo quando tudo aquilo começou. Nenhum marco histórico, nenhum acontecimento importante, nada que pudesse determinar com certeza o início daquilo que foi o seu fim. A verdade é que, diferente do que nos faz crer os filmes hollywoodianos e os livros de sucesso, não são dias especiais que mudam o curso da nossa vida, mas a sucessão de dias comuns que determina quem somos. Naquela época, tinha 17 anos e uma mente inquieta com muita coisa para falar. Como um pequeno dragão a expelir fogo, sua mente trabalhava sem descanso, mas era calada por uma boca que se recusava a emitir sons, não importava o quanto a mente fustigasse a fala, por razões ainda não explicadas pela Ciência, ou, numa visão bem plana das coisas, por simples timidez, não exprimia o que pensava ou sentia. Era o filho do meio de uma família comum, e como filho do meio, não gozava do ineditismo do primeiro, tampouco a liberdade displicente de ser o último. Assim, ainda que intuitivamente, começou a acreditar que teria de ser o melhor em tudo para ser notado. Era o primeiro a completar as tarefas, tinha as notas mais altas, o cabelo mais penteado, a cama mais arrumada, mas foi com o tempo que percebeu que para ser tudo isso, ele não tinha, e, às vezes, até não poderia, emitir sua opinião. E se era assim dentro de casa, imagine agora no grande mundo lá fora, ao qual ele iria enfrentar, como é comum aos garotos de 17 anos enfrentarem, na busca de um emprego, um lugar no mundo, uma identidade...

Perfeccionista por pressão, arrogante por convicção e calado por personalidade, acreditava que nada era páreo para ele, tinha um currículo perfeito, inúmeras qualidades o descreviam: presteza, pontualidade, prontidão. Trabalhava feito um relógio suíço, claro que conseguiria o trabalho que quisesse e uma vez nele, iria longe. E conseguiu e foi. Antes dos 30 anos, já tinha alcançado cargos de gerência, supervisão e presidência em metade do tempo que os demais mortais levariam para chegar, era um exemplo de sucesso. Sem contar que conseguiu tudo isso sem desmanchar o cabelo milimetricamente penteado com doses cavalares de gel, sorriso de comercial de pasta dental e as mais belas mulheres a tiracolo. Todos queriam imitá-lo, todos queriam ser ele, todos queriam matá-lo. Só um olhar mais atento, quase científico, perceberia que ele conquistou tudo isso sem emitir sua voz, ficando sempre em cima do muro, disposto a falar o que os outros queriam ouvir, nunca o que ele queria dizer... A sua jornada de sucesso continuou, mesmo quando não parecia que poderia chegar mais alto, ele foi lá e mostrou ser possível.

Porém em outro dia comum, daqueles que a gente não marca no calendário, uma transformação começou a se processar: sentiu um queimor no peito, uma falta de ar, um terror tomando o pensamento, estava muito ocupado para morrer. Havia vendas, fusões, gerências, vistorias a serem feitas que dependiam exclusivamente dele, como iriam ficar? Pensava que não havia batalhado tanto para, literalmente, não morrer na praia, e sim, no escritório, trabalhando! Estava obstinado a marcar uma consulta médica assim que possível, e assim o fez: apertos de mãos, ‘olá’, ‘respire’, ‘isso’, ‘vamos ver sua pressão’, ‘isso’, ‘perfeito!’, ‘somente exames de rotina’, ‘perfeitos’, ‘saúde de menino, hein!’, ‘volte sempre’, ‘ora, não, isso o senhor acerta com a moça na recepção’. Nada com a saúde, devem ser gases ou gastrite. Gases ou gastrite?! Mas o velho terror sempre voltava à espreita na forma de um aperto no coração, um pensamento aterrador à noite, uma queimação no estômago, um peso na cabeça. O hidróxido de alumínio prescrito até melhorava o desconforto, mas não aplacava o sofrimento. Por dentro corroia-se aos poucos, se desfazendo em temores, questionamentos e dúvidas, mas sempre mantendo a aparência de perfeição que o levara tão longe. O perfeito verniz. 

Foi em outro dia qualquer que um lampejo de lucidez o atingiu como um raio que acerta uma árvore seca em um campo aberto. Direto, predestinado, lançando fogo e destruição, mas também trazendo a luz. Estava sentindo o peso das palavras não ditas, dos pensamentos não externados, dos xingamentos engolidos, do completo mutismo que se auto infligiu. Por um longo tempo isto vinha secretamente tomando-lhe as articulações, arqueando-lhe as costas, tirando o brilho dos seus olhos. Durante anos, o fogo do dragão emudecido, preso em sua mente agora lhe esquentava o estômago e pesava sob o peito. Os pensamentos mais loucos, os atos inconsequentes, as rotas de fuga de uma vida planejada por ele mesmo tomaram seus pulmões, na forma de uma fumaça densa e úmida, prejudicando-lhe a respiração e levando embora o fôlego já necessário para uma última escapada. Na sua mente nada além de uma substância amorfa, negra e pegajosa, as sobras dos planos deixados pra depois prejudicavam suas sinapses e o seu pensamento, refletindo no seu olhar vazio de sempre os escombros de uma construção que nunca chegou a ser lançada a pedra fundamental. As lágrimas de anos de não expressão, apesar de algumas escaparem durante as noites mais difíceis, se acumulavam em forma de bolsas pesadas sobre os olhos dando-lhe uma aparência terrível. Estava velho, doente, mas consciente que há muito já estava morto. 

Não soube dizer a data com precisão, quando havia se calado pela primeira vez, quando havia dado o primeiro sorriso condescendente, engolido o primeiro sapo, ou até mesmo se foi o acúmulo destes ao longo de anos de inexpressão e subserviência, mas já não tinha escapatória, estava morto em vida. Não importava a causa mortis. E foi assim em outro dia qualquer que desapareceu, e não foi surpresa alguma que ninguém não deu por sua falta: presidente, gerente, pai, esposo, todos os cargos que ocupava foram devidamente preenchidos. Não havia ninguém ao seu lado para transmitir suas palavras finais (ou seriam as primeiras?), a voz trêmula, franzina, com medo do mundo a espera de ouvi-la. Com suas palavras fracas ganhando o espaço e sendo ouvidas, o homem percebeu que nada de extraordinário aconteceu quando ele falou (a não ser pelo extraordinário fato dele ter se expressado) e, com a face aterrorizada, soltou um gaguejante e débil:
- U..u...uau! 

Não se ergueram monumentos, não se marcou no calendário, nem data festiva, nem feriado em homenagem ao homem que desapareceu por que se calou, era um dia comum, como qualquer outro, destes que não definem a vida de ninguém...

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Grandes Álbuns Negligenciados da História da Música: Ryan Adams - Rock N Roll



Talvez tenha sido a incrível estréia solo, Heartbreaker, até hoje o grande sucesso comercial do cantor e compositor norte americano, Ryan Adams, ou talvez tenha sido a prolífica carreira que gerou 13 álbums em 11 anos, ou talvez até mesmo sua atitude esnobe na época de seu lançamento, mas o quarto álbum de estúdio de Adams, Rock n Roll, de 2003, nunca obteve o reconhecimento necessário que o álbum merece. Ryan Adams, anteriormente integrante da banda de alternative country Whiskeytown, já obtinha certo sucesso e reconhecimento da crítica e do público, após o lançamento de 2 álbuns geniais em carreira solo, o já citado Heartbreaker (2000) e Gold (2001), basicamente com sonoridade folk e alternative rock, até que numa ruptura de gênero decide apostar em riffs e guitarras pesadas e lança Rock n Roll. O álbum tem tudo que um disco deste gênero deve apresentar: rebeldia, um sentimento de não adequação, melancolia e até mesmo a já batida referência ao uso de entorpecentes, tudo embalado em letras fáceis, guitarras rápidas e vocais que beiram o grito em alguns momentos. Apropriando-se destes elementos, Adams procurou usá-los em referência a outras bandas do gênero como The Strokes, na introdução “This is It”, resposta à pergunta do álbum de estréia do grupo nova-iorquino, “Is This It?”, The Smiths, na faixa “Anybody Wanna Take Me Home”, e até mesmo Joy Division, em “So Alive” e “She’s Lost Total Control”, que para alguns foi entendido como uma cópia do trabalho das bandas citadas, pode ser também visto como uma homenagem aos grandes nomes do gênero. As letras inteligentes e a sonoridade pesada de Rock N Roll, foram as pedras fundamentais na construção do estilo de Ryan Adams, aprimorado mais tardiamente em “Easy Tiger” e “Ashes and Fire”. O álbum também conta com a participação de Billy Joe Armstrong, vocalista do Green Day, e Melissa Auf der Maur, nos backing vocals. 

Pra entender, ouça: “So Alive”, “Anybody Wanna Take Me Home”, “Burning Photographs” e “Wish You Were Here”.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Playlist: Summertime Sadness


Estava olhando pelos 374 blogs que eu tive no passado espalhados por toda a internet, buscando por textos antigos meus que gosto para publicar aqui, e percebi que nas inúmeras playlists que eu costumava publicar a quantidade de artistas que ouço ainda hoje. O ano era 2007 e eu ouvia Keane, John Mayer, The Killers, Ryan Adams, Norah Jones, Joss Stone.. Os anos passaram, as postagens prosseguiam, chegamos em 2013 e eu continuo ouvindo-os. Com o tempo apareceram uma ou outra novidade, bandas e artistas que nem lembro que existem e se perderam em arquivos esquecidos em um canto do HD ou do iPod. Por isso para esta primeira playlist do I.AM.U.R. resolvi selecionar, além da temática do verão, somente artistas novos, com a maioria divulgando seu primeiro trabalho ou EP, mas que mostram potencial para se tornarem constantes em outras listas no futuro. Se isso realmente irá acontecer, só o tempo (e outros 374 blogs a mais) poderão responder...

1. The Chevin - Songs for the Sun: Banda inglesa da cidade de Leeds, lançou no início de 2012 o EP "Champion", com o qual ganhou uma certa notoriedade por conta do single homônimo, e no final do ano passado lançou o álbum de estréia "Borderland". Vale a pena conhecer o trabalho da banda, bastante diversificado nesta estréia, com destaque para "Drive", segundo single extraído do álbum.

2. Pacific Air - Rpses: Dupla de irmãos que fazem um som bastante peculiar, anteriormente conhecidos pelo nome de KOKO, trazem uma mistura de rock alternativo, surf music com dream rock, algo parecido com o som do Spiritualized. Lançaram no final do ano o EP "Long Live KOKO", e tem seu disco de estréia aguardado para 2013.

3. The Neighbourhood - A Little Death: Banda californiana de rock alternativo que mistura sonoridade de hip hop com o clima noir dos filmes de detetive dos anos 50, como pode ser visto em seus clipes, em especial, "Female Robbery", que segue a "escola Lana Del Rey" de colagens videoclípticas. As semelhanças com Lana Del Rey não param por aí, parte do seu trabalho vem sendo produzido por Emile Haynie, uma das cabeças por trás do "Born to Die". Devem lançar seu álbum de estréia também em 2013.

4.  Sky Ferreira - Everything is Embarrassing: A cantora descendente de portugueses e brasileiros já é bem conhecida e queridinha da blogosfera por pelo menos uns 3 anos, porém só tem lançados EPs neste tempo. Fluindo pelos mais diferentes gêneros musicais, sem uma identidade musical definida, no último EP, Ghost, Sky Ferreira parece ter acertado a mão com o som pop dos anos 80. A espera pelo seu álbum de estréia já dura mais de um ano, será que 2013 sai?

5. HAIM - Forever: Rock dos anos 80 e 90 tocado por 3 irmãs da California, também são aguardadas em 2013 com um álbum de estréia após a comoção causada pelo EP "Forever", que mesmo sendo lançado no final de 2012, figurou em muita lista dos melhores lançamentos do ano de sites importantes.

6. The Lumineers - Ho Hey: Revelação do country/folk do ano de 2012, junto com o Alabama Shakes, lançaram seu álbum de estréia homônimo em 2012 e com o single "Ho Hey", seu refrão grudento e sem invencionices, conseguiram romper a barreira do gênero e aparecer bem nos rankings da Billboard.

7. Lana Del Rey - Summertime Sadness (Radio Mix): Grande revelação e controvérsia do ano, Lana Del Rey apareceu no final de 2011 com seu smash-hit 'Video Games', para finalmente lançar seu álbum de estréia "Born to Die" no início de 2012, e relançá-lo, precocemente diga-se de passagem, com a Paradise Edtion, em novembro de 2012. Mesmo com especulações sobre estratégia de marketing pesado, inúmeros vazamentos de discos gravados sob outro nome, Lana continua sua carreira interessada em fazer arte, e consegue, como podemos ver nos clipes de "Blue Jeans", "Ride" ou sua interpretação inspirada do clássico "Blue Velvet" ou nas suas composições como "Born to Die" e "Radio".



terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Girls

Você sabia que enquanto nós, garotos, estamos nos divertindo jogando bola, brincando de gude e colecionando figurinhas dos times do Brasileirão, as meninas frequentam uma escola secreta, que lhes ensinam a destruir os corações dos garotos em 30 lições? Instruídas por uma viúva alemã daltônica elas aprendem, desde pequenas, todos os truques de como governar um homem com um simples sorriso, uma passada de mão nos cabelos e um andar todo especial, à la Gisele Bündchen? Aprendem a desfilar lentamente, como se o mundo rodasse em slow-motion para vê-las passar, como uma zebra distraída no meio da savana africana, pronta para ser abatida por um leão faminto, ela passa calmamente. Mas, nesse ponto você já não quer abatê-la, você não é um leão, você é um homem e quer salvá-la. Quando crianças, suas bonecas sussurram-lhe nos ouvidos as vantagens de ser linda, loira de olhos azuis e ter a cintura da grossura de um polegar. Como você acha que a boneca Barbie conseguiu aquele carrão conversível, um flat com piscina e um iate? Com certeza não foi sendo boneca aeromoça, surfista, professora... Elas aprendem, desde cedo, que estamos aqui para servi-las e não há quem consiga dissuadi-las disto. Na escolinha, ela tem apenas 5 anos, usa maria-chiquinha e ainda lhe faltam os dentes da frente, mas basta apenas um sorriso e um brilho diferente nos olhos e pronto! Você, apaixonado, está disposto a passar todo o seu recreio fazendo as coisas mais estúpidas para lhe chamar a atenção e isso inclui puxar seus cabelos, botar-lhe apelidos descabidos e fingir que não está nem aí pra ela... Ledo engano... Aos 13 anos, ainda estamos usando aparelho, com a cara entupida de espinhas e medindo 1,42m, enquanto elas experimentam seus primeiros sutiãs e explodem em beleza, na vivificação da metáfora da lagarta transformando-se em borboleta. Aos 18, ela não é mais uma aluna, após anos de treinamento prático de enrolação de babacas, graduou-se com mérito em arte da sedução e pretende seguir carreira como destruidora de corações. Talento nato. Mais tarde, a despeito de toda educação, ela decide baixar a guarda e se apaixona. Mas, claro que não é por você. O cara é um cafajeste e até você, que não é lá boa peça, reconhece isso, mas ela não. Ela enxerga nele o maldito príncipe encantado que um desenho infantil lhe prometera quando criança (na base da mensagem subliminar) e em você, ela só enxerga um... blargh! Um amigo! Preferem acreditar na ilusão de um príncipe encantando a enxergar o cara que sabe de suas preocupações e anseios, sabe lhe fazer rir e estará lá quando ela precisar chorar. Essa é a lição mais terrível que a instrutora alemã lhes passa: Não namorem seus amigos! Então, por uma conjunção dos astros você consegue achar a mulher ideal e convencê-la de que casar com você não é lá muito mau negócio. Tudo bem que você usa um argumento barato para disfarçar, mas a verdade é que você não consegue mais respirar sem ela ao seu lado e por isso você aceita tudo que ela lhe propõe. Ela escolhe a igreja, o apartamento, o nome dos filhos e que você não deve usar mais essa camisa do Brasil da Copa de 90. E tudo segue muito bem, com os pequenos jogos de poder e controle que os casais jogam por jogar, pois sabemos que o controle é todo delas, até o dia que você descobre uma outra paixão. De novo, você está caidinho por uma garotinha. Só que ela tem 5 anos, de maria-chiquinha e sem os dentes da frente. Ela é sua filha e você não está disposto só a perder o recreio, como também toda sua vida, na tentativa de agradá-la e protegê-la de um mundo cruel, terrível e cheio de garotos não muito diferentes de você quando era jovem. É neste momento que você percebe que o mundo é delas e que não adianta tentar entendê-las, assim como elas perdem o seu tempo tentando decifrar nossos pensamentos confusos e interrompidos (por obra delas). Nunca saberemos o quê se passa em suas mentes e é aí onde reside a beleza e o mistério da mulher. O máximo que podemos fazer é nos maravilhar com essa bela confusão que adoramos nos meter. E não conseguimos viver sem. Mesmo que elas ainda relutem em namorar com os amigos. E acreditem nos cafajestes.

Perfeito Medíocre

Tente ser o melhor. Tente reduzir o consumo de porcarias. Tente baixar o seu colesterol. Coma menos açúcar. Use seu melhor sorriso. Use seu tempo disponível. Todo ele, de preferência. Escolha uma carreira. Tente ser o melhor nela. Saiba, portanto, que seu esforço pode não ser o suficiente. Chegue sempre no horário, assim você estará mais propenso às oportunidades. Oportunidades se traduzem em dinheiro (este que parece ser o combustível por estas bandas). Tente ser realizado profissionalmente. Para isso esqueça o cara ao lado que não faz 10% do seu trabalho e ganha dez vezes mais do que você (esqueça também os salários dos jogadores de futebol). Aprenda outra língua. Aprenda quantas línguas puder. Aprenda a segurar a sua língua. Saiba ficar invisível. Fique assim sempre que sentir vontade de gritar com alguém. Ou até consigo mesmo. Aprenda a segurar as emoções. Principalmente em público. Marketing é tudo. Tente vender-se da melhor maneira possível. Apare suas arestas. Exceções não são bem-vindas. Embora gostem de valorizar os extraordinários, somente na mediocridade se encontra a paz. Seja mediano. Seja medíocre. Guarde seus melhores pensamentos e idéias para você mesmo. Execute-os nos seus sonhos. Aproveite a vida. Aproveite a juventude. Conheça países distantes. Sonhe com Nova York. Roube e traga consigo as emoções falseadas dos musicais da Broadway, enquanto pensa em aviões, prédios e como uma idéia pode derrubá-los. Sonhe com Londres. Imagine uma existência mais feliz por estar perante o Big Ben e uma realeza postiça adorada por súditos que acompanham suas vidas pelas páginas dos tablóides. Sonhe com Paris. Lembre dos ideais da Revolução enquanto passeia na Rive Gauche, prestes a gastar 3 salários da população ordinária em uma calça que invariavelmente você não usará. “Liberdade, Igualidade, Fraternidade”. Esqueça Níger. Esqueça São Paulo. Esqueça Bogotá. Esqueça o Hemisfério Sul. Por que ele ficaria ao Sul, afinal? Tenha um credo. Acredite piamente em algo maior (deve haver algo maior). Facilita muito as coisas. Aprisione a sua criança interior. Mesmo quando esta insistir em escapar por uma gargalhada ou em uma manhã de sábado quando o brilho do sol tentar mascarar que as coisas não são tão ruins. Por fim, procure um amor. Achando, bom pra você. Não achando, bom pra você. Mesmo que ache, ainda assim seu fim poderá ser sozinho (e não há do que se envergonhar). Ouça boas músicas. Veja bons filmes. Até mesmo aqueles com o Jim Carrey, se conseguir considerá-los bons. Atenha-se aos prazos. Tudo neste mundo tem uma data de validade. Contas, trabalhos, amizades, amores e até mesmo você. E, quando seu prazo expirar, sua vida passará diante dos seus olhos. Seus erros, acertos, decisões, vacilos, balanços, tudo será exposto na eternidade de um segundo, como você sempre ouviu dizer que era, mas preferiu não acreditar por achar muito “clichê”. Quando isso acontecer, já não importará tudo que você fez na vida. Se foi um médico ou um monstro. Se foi branco ou negro. Se sua carteira vivia cheia ou se você vivia no vermelho. Todas as pessoas nesse breve longo instante se resumem a ínfimas criaturas vivendo em um universo em constante expansão. Petrificadas diante do desconhecido. Indefesas diante do juízo de suas próprias consciências. Atônitas com a ausência de resposta para uma pergunta desconcertante: “Você realmente viveu?”. Aos que viveram, a eternidade. Estarão presos na memória de quem ainda está vivo, renascidos na simples menção de seu nome, presentes para sempre. Aos que não viveram, restará a ilogicidade de morrer sem mesmo viver. E desaparecerão no nada.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

La Jeunesse

Espero pelo dia em que recordarei com nostalgia de dias como esses. Dias em que sou jovem, belo e saudável. Belo e saudável?! Ok, vamos partir do pressuposto que isso é a verdade, pois quando se é jovem, apesar dos crescentes índices de morbi-mortalidade e feiúra, se é belo e saudável. Então, suspirarei com pesar, frente ao maçante presente, sobre passeios na praia, sexo casual, pequenos atos de terrorismo social encarados como se o mundo girasse ao meu entorno e sob à minha vontade. A vida então, na minha juventude, será como um eterno verão, sem problemas, pernas para fora, pele eternamente bronzeada e sorrisos de propagandas de creme dental. Mas será que foi isso mesmo? Pois tudo que vivo são dias iguais, repetidos, saltados por um ou dois acontecimentos que daqui à um mês eu não vou lembrar. A faculdade me toma 89% da minha vida e, não, eu não estou reclamando disto. Não disto.

Eu passo os dias esperando chegar o final de semana para na sexta feira eu sair e não gostar, e no sábado, eu arrepender-me de ter saído na sexta e acabar sozinho, zapeando por programas de humor sem graça e sitcoms sobre uma outra juventude. Um pouco mais velha, é verdade, mas também frustada com seus empregos e com medo de envelhecer sozinho. Pode soltar a risada de auditório. A juventude é uma piada sem-graça. Ninguém está rindo.

Eu afundo na tecnologia, música indie-rock e comida delivery e é só mais uma fuga. Não sou muito diferente de quem acha que por acompanhar a vida dos ídolos pop norte-americanos, tem a vida 7% mais interessante do que a população normal. Os livros não possuem as respostas, cansei de buscá-las. As telas de cinema, na melhor das hipóteses, oferecem um escape do mundo real por 2 horas, isso se não ofertarem um outro tipo de ilusão, com pessoas infinitamente mais realizadas profissional e pessoalmente do quê eu jamais serei. Todos os problemas se resolvem no tempo da projeção. Deve ser por isso que se chama cinema.

Tenho que comprar todos os lançamentos da Apple, mesmo sabendo, no momento da compra, que aquele objeto está fadado a tornar-se obsoleto em 8 meses. Como Adão e Eva, ainda não sabemos resistir à uma maçã, hein? Na vida amorosa, o máximo que consigo são 2 encontros com garotas que riem sem razão aparente e que não têm objetivo maior na vida do que combinar os sapatos com a blusa, e nem isso, Deus, conseguem fazer direito. É a velha máxima "quem me interessa, não me quer" (ou ao menos sabe que eu existo e das minhas intenções?). Se é mesmo que existo e não sou a projeção de uma quase-vida. Um sonho dentro do sonho, como no filme que vi um dia desses.

Estou com raiva dos meus pais e nem sequer me lembro a razão. Não os culpo por nada, deve ser difícil acordar e não ter mais nada que fazer a não ser pôr no modo ‘automático’. Eu sei como é isso, sei desde os 13 anos. Eu já sabia que seria desta maneira... De alguma forma, tive essa visão do futuro naquela época e desde então carrego um quase sorriso no rosto: mezzo conveniência, mezzo sarcasmo. A gente nunca vai ter mais do que isso, sabe? As espinhas que saíam, com mais frequência e fúria do que hoje, coloriram meu rosto, denunciando que havia algo em ebulição abaixo da superfície. Troubled water runs deep. Será que a chama se apagou ou o ponto de ebulição está alto demais? Há muito tempo aprendi que por ter o ponto de ebulição de 100° C, a água pode ser encontrada na forma líquida na Terra e que após uma intricada série de reações químicas muito complicadas para acontecerem de verdade, deu início a um processo que continua até hoje… -Voilá! Fez-se a Vida, nascida nas águas de um oceano primordial, atualmente recostada no meu sofá…

Mas tudo isso não interessará quando estiver grisalho e as lembranças forem uma névoa de insatisfação e comodismo, onde me perguntarei se não fui a bares e boates suficientes? Onde gastei o meu precioso tempo? Já não fiz besteiras suficientes esperando pela vida acontecer e assistindo a juventude passar? Pode soltar a risada de auditório e subir os créditos. Ninguém está rindo.